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MPT-MS capacita servidores da assistência social sobre acolhimento a resgatados do trabalho escravo

Iniciativa realizada no municípios de Amambai, Coronel Sapucaia e Paranhos busca criar uma rede de colaboração interinstitucional robusta, essencial para o enfrentamento deste problema histórico e profundamente enraizado na cultura do estado

 

Campo Grande – Cansados, desorientados, perdidos em relação ao futuro. Esse é o cenário psicossocial de quem sobreviveu durante meses, até mesmo anos, em condições degradantes de trabalho, longe do apoio, da vigilância e de qualquer ajuda que poderia ter aliviado seu sofrimento. Esses trabalhadores, submetidos a um regime de exploração análogo à escravidão, muitas vezes se sentem menos que humanos, com suas identidades corroídas pelo constante abuso. Eles são assombrados por traumas profundos, presos em um ciclo de desesperança e submissão, enraizado em suas próprias mentes. Em outro contexto, há também aqueles que, tendo herdado a escravidão dos seus antepassados e nascido nessa condição, sequer percebem que são escravos. Torna-se essencial, além do resgate físico, oferecer também o apoio psicológico, proporcionando-lhes o acompanhamento necessário para que possam reconstruir suas vidas com dignidade.

Diante dessa situação em que se perpetua a vulnerabilidade e a coerção laboral, o Ministério Público do Trabalho em Mato Grosso do Sul (MPT-MS), por intermédio da Coordenadoria Nacional de Combate ao Trabalho Escravo (Conaete), realizou entre os dias 21 e 23 de maio uma operação que incluiu treinamentos para 44 servidores da Rede Socioassistencial dos municípios de Amambai, Coronel Sapucaia e Paranhos, localizados na região sul do estado, fronteira com o Paraguai. Além disso, foram realizadas visitas institucionais nas delegacias de Polícia Civil desses municípios a fim de estreitar relações e discutir estratégias conjuntas para combater o trabalho análogo à escravidão na região.

Conduzido pelo coordenador regional da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (CONAETE), procurador Paulo Douglas Almeida de Moraes, e pela assessora do MPT-MS, Paola Gomes da Silva, o programa de capacitação visa auxiliar na instrução desses profissionais para identificação de casos e no momento do pós-resgate de trabalhadores, abordando o acolhimento, orientação e acompanhamento daqueles que foram submetidos à experiência traumática de viver e laborar sob circunstâncias inadmissíveis de violação de direitos.

Conforme esclarece o coordenador regional da CONAETE, a ação foi delineada estrategicamente para suprir as necessidades específicas da região e criar um impacto duradouro na luta contra o trabalho escravo. “Essa iniciativa é especialmente relevante na região sul do estado, uma área que faz fronteira com o país vizinho e possui alguns dos menores Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) de Mato Grosso do Sul. Além disso, a região concentra uma grande população indígena, o que a torna estratégica para a repressão ao trabalho análogo à escravidão, devido à vulnerabilidade de muitos trabalhadores que podem ser facilmente cooptados para propriedades rurais mais isoladas, longe da vigilância e distantes das áreas urbanizadas”, observou.

Atuação ostensiva contra a exploração laboral

O procurador do Trabalho complementa sobre o impacto da iniciativa junto aos agentes públicos de transformação da localidade. “A receptividade dos profissionais de assistência social nos municípios visitados foi muito positiva. A expectativa é de um aperfeiçoamento contínuo na qualidade do atendimento às vítimas do trabalho escravo no Mato Grosso do Sul, a fim de assegurar que esses profissionais estejam bem preparados para oferecer o suporte necessário e, dessa maneira, efetivamente poder ajudar as vítimas a reconstruírem suas vidas com dignidade e segurança.”

O treinamento abordou diversos tópicos fundamentais para o combate ao trabalho escravo contemporâneo. Inicialmente, foram discutidas as quatro dimensões do conceito de trabalho escravo contemporâneo e os métodos para identificá-las. Em seguida, foi detalhado o Fluxo Nacional de Atendimento às Vítimas de Trabalho Escravo, aprovado pela Comissão Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Portaria nº 3.484/2021), dividido em três estágios que compõem o processo. Também foram explicados os 12 passos de atuação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) em meio a esse fluxo. Ainda houve a instrução sobre a utilização do Observatório Nacional da Erradicação do Trabalho Escravo – Smartlab, uma plataforma desenvolvida pelo MPT em parceria com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), que oferece dados e ferramentas para monitorar e combater o trabalho escravo. Por fim, foram divulgados os canais oficiais de denúncia, como o Disque 100, MPF Denúncias, MPT Denúncias e o Sistema Ypê, essenciais para o reporte de casos e a mobilização de ações.

“A capacitação da rede de atendimento às vítimas de escravidão contemporânea é um dos projetos mais importantes da CONAETE. Nosso objetivo é promover o conhecimento e fortalecer as atribuições institucionais de cada órgão que atua, direta ou indiretamente, no resgate de trabalhadores submetidos a condições análogas à escravidão. No âmbito desta temática, ministramos os cursos para os servidores da rede de Assistência Social de Coronel Sapucaia, Paranhos e Amambai, municípios que atualmente possuem desafios consideráveis em relação ao desenvolvimento socioeconômico,” explicou a assessora institucional do MPT-MS, que integra a força-tarefa, Paola Gomes da Silva.

Foco na proteção dos direitos dos trabalhadores indígenas

Zenaldo Moreira, secretário municipal de Ações Indígenas de Amambai, destaca a atuação da secretaria no atendimento a três comunidades indígenas: Aldeia Amambai, Aldeia Limão Verde e Aldeia Jaguari. Ele observa a recorrência do trabalho análogo à escravidão como um dos grandes entraves enfrentados atualmente. “Como secretário municipal de Ações Indígenas do município, estou ciente das grandes problemáticas que enfrentamos, especialmente no combate ao trabalho análogo à escravidão. A secretaria, em conjunto com outros órgãos como a Assistência Social, tem se esforçado para enfrentar essa realidade. A visita do procurador do Trabalho Paulo Douglas e sua equipe para realizar a capacitação foi de suma importância. Precisamos dar mais atenção aos direitos frequentemente violados. Em nossa comunidade, muitas pessoas não têm conhecimento das políticas e direitos que as amparam legalmente, o que resulta em frequentes violações por falta de entendimento e orientação.”

Moreira enfatizou a importância da colaboração interinstitucional a fim de lançar luz sobre as sombras da escravidão contemporânea. “A parceria com órgãos como o Ministério Público do Trabalho é fundamental para dar voz à comunidade indígena e garantir a proteção de seus direitos. Agradeço ao MPT-MS pela colaboração e reforço o nosso compromisso de continuar trabalhando em prol das comunidades indígenas, especificamente os povos Guarani-Kaiowá, nesta região de Mato Grosso do Sul.”

 

 

MPT 

 

 

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